quinta-feira, 26 de janeiro de 2012
"ELEMENTOS DE CONVICÇÃO"
"Visitante – Eu convenho, senhor, que, do ponto de vista filosófico, a Doutrina Espírita é perfeitamente racional. Mas, resta sempre a questão das manifestações que não pode ser resolvida senão pelos fatos; ora, é a realidade desses fatos que muitas pessoas contestam e não deveis achar espantoso o desejo que se exprime de testemunhá-los.
A.K. – Acho isso muito natural; somente, como procuro que sejam proveitosos, explico em que condições convém se colocar para melhor observá-los e, sobretudo, para compreendê-los. Ora, aquele que não quer se colocar nessas condições é porque não tem desejo sério de se esclarecer e, então, é inútil perder-se tempo com ele.
Compreendereis também, senhor, que seria estranho que uma filosofia racional tivesse saído de fatos ilusórios e controvertidos. Em boa lógica, a realidade do efeito implica na realidade da causa; se um é verdadeiro, o outro não pode ser falso, porque onde não houvesse árvore não se recolheriam frutos.
Todo o mundo, é verdade, não pôde constatar os fatos, porque todo o mundo não se colocou nas condições desejadas para os observar e, para isso, não se armou da paciência e perseverança necessárias. Mas, ocorre aqui como em todas as ciências: o que uns não fazem, outros o fazem: todos os dias, aceita-se o resultado de cálculos astronômicos sem os ter feito. Qualquer que ela seja, se achais uma filosofia boa, podereis aceitá-la como aceitaríeis uma outra, reservando, porém, vossa opinião sobre os caminhos e meios que a ela conduziram, ou, pelos menos, não admitindo-a senão como hipótese até mais ampla constatação.
Os elementos de convicção não são os mesmos para todo o mundo; o que convence a alguns, não causa nenhuma impressão sobre outros: por isso é preciso um pouco de tudo. Mas, é um erro crer-se que as experiências físicas sejam o único meio de convencer. Vi pessoas que os fenômenos mais notáveis não puderam sacudir e para as quais uma simples resposta escrita triunfou. Quando se vê um fato que não se compreende, quanto mais ele é extraordinário, mais parece suspeito, e o pensamento nele procura sempre uma causa vulgar. Se se o compreende, mais facilmente é admitido porque tem uma razão de ser: o maravilhoso e o sobrenatural desaparecem. Certamente, as explicações que vos acabo de dar nesta entrevista estão longe de serem completas; mas, por mais sumárias que sejam, estou persuadido de que vos levarão a refletir e, se as circunstâncias vos testemunharem quaisquer fatos de manifestações, os vereis com menos prevenção, porque podereis raciocinar com base.
Há duas coisas no Espiritismo: a parte experimental das manifestações e a doutrina filosófica. Ora, todos os dias sou visitado por pessoas que nada viram e crêem tão firmemente como eu apenas pelo estudo que fizeram da parte filosófica; para elas o fenômeno das manifestações é acessório e o fundo é a doutrina, a ciência. Elas a vêem grande, tão racional, que nela encontram tudo o que pode satisfazer suas aspirações íntimas, sem o fato das manifestações, de onde concluem que, supondo-se que as manifestações não existissem, a doutrina não seria menos aquela que resolve melhor uma multidão de problemas reputados insolúveis. Quantos não disseram que essas idéias tinham germinado no seu cérebro, mas que elas aí estavam confusas! O Espiritismo veio formulá-las, dar-lhes um corpo, e foi para eles como um rasgo de luz. Isso explica o número de adeptos que apenas a leitura de O Livro dos Espíritos fez. Acreditais que ela estaria assim se não tivesse passado das mesas girantes e falantes?
Visitante – Tendes razão em dizer, senhor, que das mesas girantes saiu uma doutrina filosófica; e eu estava longe de supor as conseqüências que poderiam surgir de uma coisa que se olhava como simples objeto de curiosidade. Vejo agora quanto é vasto o campo aberto pelo vosso sistema.
A.K. – Aqui eu vos detenho, senhor; me fazeis muita honra atribuindo-me esse sistema, porque não me pertence. Ele foi inteiramente deduzido do ensinamento dos Espíritos. Eu vi, observei, coordenei, e procuro fazer os outros compreenderem o que eu próprio compreendo; eis toda a parte que nele me cabe. Há entre o Espiritismo e os outros sistemas filosóficos esta diferença capital: os últimos são obra de homens mais ou menos esclarecidos, enquanto que naquele que vós me atribuís não tenho o mérito de invenção de um único princípio. Diz-se: a filosofia de Platão, de Descartes, de Leibnitz; não se dirá: a doutrina de Allan Kardec, e isso é bom, pois que importância teria um nome em uma tão grave questão? O Espiritismo tem auxiliares bem mais preponderantes, perto dos quais não somos senão átomos."
("O que é o Espiritismo", Allan Kardec)
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