quinta-feira, 18 de agosto de 2016

"EU " CONTRA "EU"

"Quando o Homem ainda jovem desejou cometer o primeiro desatino, aproximou-se o Bom Senso e observou-lhe.

 -Detém-te! Por que te confias assim ao mal? 

 O interpelado, porém respondeu orgulhoso:

 -Eu quero. 

 Passando, mais tarde, à condição de perdulário e adotando a extravagância e a loucura por normas de viver, apareceu a Ponderação e aconselhou-o: 

 -Pára! Por que te consagras, desse modo, ao gasto inconsequente? 

 Ele, contudo, esclareceu jactancioso:

 -Eu posso.

 Mais tarde, mobilizando os outros a serviço da própria insensatez, recebeu a visita da Humildade, que lhe rogou, piedosa: 

-Reflete! Por que te não compadeces dos mais fracos e dos mais ignorantes? 

 O infeliz, todavia, redarguiu colérico.

 -Eu mando. 

 Absorvendo imensos recursos, inutilmente, quando poderia beneficiar a coletividade, abeirou-se dele o Amor e pediu:

 -Modifica-te! Sê caridoso! Como podes reter o rio das oportunidades sem socorrer o campo das necessidades alheias? 

 E o mísero informou:

 -Eu ordeno.

 Praticando atos condenáveis, que o levaram ao pelourinho da desaprovação pública, a Justiça acercou-se dele e recomendou? 

 -Não prossigas! Não te dói ferir tanta gente? 

 O infortunado, entretanto, acentuou implacável:

 -Eu exijo. 

 E assim viveu o Homem, acreditando-se o centro do Universo, reclamando, oprimindo e dominando, sem ouvir as sugestões das virtudes que iluminam a Terra, até que, um dia, a Morte o procurou e lhe impôs a entrega do corpo físico. O desditoso entendeu a gravidade do acontecimento, prosternou-se diante dela e considerou: 

 -Morte, por que me buscas? 

 -Eu quero-disse ela. 

 -Por que me constranges a aceitar-te?-gemeu triste. 

 -Eu posso-retrucou a visitante. 

 -Como podes atacar-me deste modo?

 -Eu mando. 

 -Que poderes te movem? 

 -Eu ordeno. 

 -Defender-me-ei contra ti -clamou o Homem, desesperado-, duelarei e receberás a minha maldição!...

 Mas a Morte sorriu imperturbável, e afirmou:

 -Eu exijo. 

 E, na luta do "eu", contra "eu", conduziu-o à casa da Verdade para maiores lições."
("Contos e Apólogos", Irmão X/Francisco Cândido Xavier)

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