"O Espiritismo não vem, pois, com sua autoridade privada, formular um código de
fantasia; a sua lei, no que respeita ao futuro da alma, deduzida das observações
do fato, pode resumir-se nos seguintes pontos:
1º - A alma ou Espírito
sofre na vida espiritual as conseqüências de todas as imperfeições que não
conseguiu corrigir na vida corporal. O seu estado, feliz ou desgraçado, é
inerente ao seu grau de pureza ou impureza.
2º A completa felicidade
prende-se à perfeição, isto é, à purificação completa do Espírito. Toda
imperfeição é, por sua vez, causa de sofrimento e de privação de gozo, do mesmo
modo que toda perfeição adquirida é fonte de gozo e atenuante de
sofrimentos.
3º - Não há uma única imperfeição da alma que não importe
funestas e inevitáveis conseqüências, como não há uma só qualidade boa que não
seja fonte de um gozo.
A soma das penas é, assim, proporcionada à soma
das imperfeições, como a dos gozos à das qualidades.
A alma que tem dez
imperfeições, por exemplo, sofre mais do que a que tem três ou quatro; e quando
dessas dez imperfeições não lhe restar mais que metade ou um quarto, menos
sofrerá.
De todo extintas, então a alma será perfeitamente feliz. Também
na Terra, quem tem muitas moléstias, sofre mais do que quem tenha apenas uma ou
nenhuma. Pela mesma razão, a alma que possui dez perfeições, tem mais gozos do
que outra menos rica de boas qualidades.
4º - Em virtude da lei do
progresso que dá a toda alma a possibilidade de adquirir o bem que lhe falta,
como de despojar-se do que tem de mau, conforme o esforço e vontade próprios,
temos que o futuro é aberto a todas as criaturas. Deus não repudia nenhum de
seus filhos, antes recebe-os em seu seio à medida que atingem a perfeição,
deixando a cada qual o mérito das suas obras.
5º - Dependendo o
sofrimento da imperfeição, como o gozo da perfeição, a alma traz consigo o
próprio castigo ou prêmio, onde quer que se encontre, sem necessidade de lugar
circunscrito.
O inferno está por toda parte em que haja almas sofredoras,
e o céu igualmente onde houver almas felizes.
6º - O bem e o mal que
fazemos decorrem das qualidades que possuímos. Não fazer o bem quando podemos e,
portanto, o resultado de uma imperfeição. Se toda imperfeição é fonte de
sofrimento, o Espírito deve sofrer não somente pelo mal que fez como pelo bem
que deixou de fazer na vida terrestre.
7º - O Espírito sofre pelo mal que
fez, de maneira que, sendo a sua atenção constantemente dirigida para as
conseqüências desse mal, melhor compreende os seus inconvenientes e trata de
corrigir-se.
8º - Sendo infinita a justiça de Deus, o bem e o mal são
rigorosamente considerados, não havendo uma só ação, um só pensamento mau que
não tenha conseqüências fatais, como não na uma única ação meritória. um só bom
movimento da alma que se perca, mesmo para os mais perversos, por isso que
constituem tais ações um começo de progresso.
9º - Toda falta cometida,
todo mal realizado é uma dívida contraída que deverá ser paga; se o não for em
urna existência, sê-lo-á na seguinte ou seguintes, porque todas as existências
são solidárias entre si. Aquele que se quita numa existência não terá
necessidade de pagar segunda vez.
10º - O Espírito sofre, quer no mundo
corporal, quer no espiritual, a conseqüência das suas imperfeições. As misérias,
as vicissitudes padecidas na vida corpórea, são oriundas das nossas
imperfeições, são expiações de faltas cometidas na presente ou em precedentes
existências.
Pela natureza dos sofrimentos e vicissitudes da vida
corpórea, pode julgar-se a natureza das faltas cometidas em anterior existência,
e das imperfeições que as originaram.
11º - A expiação varia segundo a
natureza e gravidade da falta, podendo, portanto, a mesma falta determinar
expiações diversas, conforme as circunstâncias, atenuantes ou agravantes, em que
for cometida.
12º - Não há regra absoluta nem uniforme quanto à natureza
e duração do castigo: - a única lei geral é que toda falta terá punição, e terá
recompensa todo ato meritório, segundo o seu valor.
13º - A duração do
castigo depende da melhoria do Espírito culpado.
Nenhuma condenação por
tempo determinado lhe é prescrita. O que Deus exige por termo de sofrimentos é
um melhoramento sério, efetivo, sincero, de volta ao bem.
Deste modo o
Espírito é sempre o árbitro da própria sorte, podendo prolongar os sofrimentos
pela pertinácia no mal, ou suavizá-los e anulá-los pela prática do
bem.
Uma condenação por tempo predeterminado teria o duplo inconveniente
de continuar o martírio do Espírito renegado, ou de libertá-lo do sofrimento
quando ainda permanecesse no mal. Ora, Deus, que é justo, só pune o mal enquanto
existe, e deixa de o punir quando não existe mais (1); por outra, o mal moral,
sendo por si mesmo causa de sofrimento, fará este durar enquanto subsistir
aquele, ou diminuirá de intensidade à medida que ele decresça.
(1) Vede
cap. VI, nº 25, citação de Ezequiel.
14º - Dependendo da melhoria do
Espírito a duração do castigo, o culpado que jamais melhorasse sofreria sempre,
e, para ele, a pena seria eterna.
15º - Uma condição inerente à
inferioridade dos Espíritos é não lobrigarem o termo da provação, acreditando-a
eterna, como eterno lhes parece deva ser um tal castigo. (2)
(2) Perpétuo
é sinônimo de eterno. Diz-se o limite das neves perpétuas; o eterno gelo dos
pólos; também se diz o secretário perpétuo da Academia, o que não significa que
o seja ad perpetuam, mas unicamente por tempo ilimitado. Eterno e perpétuo se
empregam, pois, no sentido de indeterminado. Nesta acepção pode dizer-se que as
penas são eternas, para exprimir que não têm duração limitada; eternas,
portanto, para o Espírito que lhes não vê o termo.
16º - O
arrependimento, conquanto seja o primeiro passo para a regeneração, não basta
por si só; são precisas a expiação e a reparação.
Arrependimento,
expiação e reparação constituem, portanto, as três condições necessárias para
apagar os traços de uma falta e suas conseqüências. O arrependimento suaviza os
travos da expiação, abrindo pela esperança o caminho da reabilitação; só a
reparação, contudo, pode anular o efeito destruindo-lhe a causa. Do contrário, o
perdão seria uma graça, não uma anulação.
17º - O arrependimento pode
dar-se por toda parte e em qualquer tempo; se for tarde, porém, o culpado sofre
por mais tempo.
Até que os últimos vestígios da falta desapareçam, a
expiação consiste nos sofrimentos físicos e morais que lhe são conseqüentes,
seja na vida atual, seja na vida espiritual após a morte, ou ainda em nova
existência corporal.
A reparação consiste em fazer o bem àqueles a quem
se havia feito o mal. Quem não repara os seus erros numa existência, por
fraqueza ou má-vontade, achar-se-á numa existência ulterior em contacto com as
mesmas pessoas que de si tiverem queixas, e em condições voluntariamente
escolhidas, de modo a demonstrar-lhes reconhecimento e fazer-lhes tanto bem
quanto mal lhes tenha feito. Nem todas as faltas acarretam prejuízo direto e
efetivo; em tais casos a reparação se opera, fazendo-se o que se deveria fazer e
foi descurado; cumprindo os deveres desprezados, as missões não preenchidas;
praticando o bem em compensação ao mal praticado, isto é, tornando-se humilde se
se tem sido orgulhoso, amável se se foi austero, caridoso se se tem sido
egoísta, benigno se se tem sido perverso, laborioso se se tem sido ocioso, útil
se se tem sido inútil, frugal se se tem sido intemperante, trocando em suma por
bons os maus exemplos perpetrados. E desse modo progride o Espírito,
aproveitando-se do p róprio passado. (1)
(1) A necessidade da reparação é
um princípio de rigorosa justiça. que se pode considerar verdadeira lei de
reabilitação morai dos Espíritos. Entretanto, essa doutrina religião alguma
ainda a proclamou. Algumas pessoas repelem-na porque acham mais cômodo o poder
quitarem-se das más ações por um simples arrependimento, que não custa mais que
palavras, por meio de algumas fórmulas; contudo, crendo-se, assim, quites, verão
mais tarde se isso lhes bastava. Nós poderíamos perguntar se esse principio não
é consagrado pela lei humana, e se a justiça divina pode ser inferior à dos
homens? E mais, se essas leis se dariam por desafrontadas desde que o indivíduo
que as transgredisse, por abuso de confiança, se limitasse a dizer que as
respeita infinitamente.
Por que hão de vacilar tais pessoas perante uma
obrigação que todo homem honesto se impõe como dever, segundo o grau de suas
forças?
Quando esta perspectiva de reparação for inculcada na crença das
massas, será um outro freio aos seus desmandos, e bem mais poderoso que o
inferno e respectivas penas eternas, visto como interessa a vida em sua plena
atualidade, podendo o homem compreender a procedência das circunstâncias que a
tornam penosa, ou a sua verdadeira situação.
18º - Os Espíritos
imperfeitos são excluídos dos mundos felizes, cuja harmonia perturbariam. Ficam
nos mundos inferiores a expiarem as suas faltas pelas tribulações da vida, e
purificando-se das suas imperfeições até que mereçam a encarnação em mundos mais
elevados, mais adiantados moral e fisicamente. Se se pode conceber um lugar
circunscrito de castigo, tal lugar é, sem dúvida, nesses mundos de expiação, em
torno dos quais pululam Espíritos imperfeitos, desencarnados à espera de novas
existências que lhes permitam reparar o mal, auxiliando-os no
progresso.
19º - Como o Espírito tem sempre o livre-arbítrio, o progresso
por vezes se lhe torna lento, e tenaz a sua obstinação no mal. Nesse estado pode
persistir anos e séculos, vindo por fim um momento em que a sua contumácia se
modifica pelo sofrimento, e, a despeito da sua jactância, reconhece o poder
superior que o domina.
Então, desde que se manifestam os primeiros
vislumbres de arrependimento, Deus lhe faz entrever a esperança. Nem há Espírito
incapaz de nunca progredir, votado a eterna inferioridade, o que seria a negação
da lei de progresso, que providencialmente rege todas as criaturas.
20º -
Quaisquer que sejam a inferioridade e perversidade dos Espíritos, Deus jamais os
abandona. Todos têm seu anjo de guarda (guia) que por eles vela, na persuasão de
suscitar-lhes bons pensamentos, desejos de progredir e, bem assim, de
espreitar-lhes os movimentos da alma, com o que se esforçam por reparar em uma
nova existência o mal que praticaram. Contudo, essa interferência do guia faz-se
quase sempre ocultamente e de modo a não haver pressão, pois que o Espírito deve
progredir por impulso da própria vontade, nunca por qualquer sujeição.
O
bem e o mal são praticados em virtude do livre-arbítrio, e, conseguintemente,
sem que o Espírito seja fatalmente impelido para um ou outro
sentido.
Persistindo no mal, sofrerá as conseqüências por tanto tempo
quanto durar a persistência, do mesmo modo que, dando um passo para o bem, sente
imediatamente benéficos efeitos.
OBSERVAÇÃO - Erro seria supor que, por
efeito da lei de progresso, a certeza de atingir cedo ou tarde a perfeição e a
felicidade pode estimular a perseverança no mal, sob a condição do ulterior
arrependimento: primeiro porque o Espírito inferior não se apercebe do termo da
sua situação; e segundo porque, sendo ele o autor da própria infelicidade, acaba
por compreender que de si depende o fazê-la cessar; que por tanto tempo quanto
perseverar no mal será infeliz; finalmente, que o sofrimento será intérmino se
ele próprio não lhe der fim. Seria, pois, um cálculo negativo, cujas
conseqüências o Espírito seria o primeiro a reconhecer. Com o dogma das penas
irremissíveis é que se verifica, precisamente, tal hipótese, visto como é para
sempre interdita qualquer idéia de esperança, não tendo pois o homem interesse
em converter-se ao bem, para ele sem proveito.
Diante dessa lei, cai
também a objeção extraída da presciência divina, pois Deus, criando uma alma,
sabe efetivamente se, em virtude do seu livre-arbítrio, ela tomará a boa ou a má
estrada; sabe que ela será punida se fizer o mal; mas sabe também que tal
castigo temporário é um meio de fazê-la compreender o erro, cedo ou tarde
entrando no bom caminho. Pela doutrina das penas eternas conclui-se que Deus
sabe que essa alma falirá e, portanto, que está previamente condenada a torturas
infinitas.
21º - A responsabilidade das faltas é toda pessoal, ninguém
sofre por erros alheios, salvo se a eles deu origem, quer provocando-os pelo
exemplo, quer não os impedindo quando poderia fazê-lo.
Assim, o suicida é
sempre punido; mas aquele que por maldade impele outro a cometê-lo, esse sofre
ainda maior pena.
22º - Conquanto infinita a diversidade de punições,
algumas há inerentes à inferioridade dos Espíritos, e cujas conseqüências, salvo
pormenores, são pouco mais ou menos idênticas.
A punição mais imediata,
sobretudo entre os que se acham ligados à vida material em detrimento do
progresso espiritual, faz-se sentir pela lentidão do desprendimento da alma; nas
angústias que acompanham a morte e o despertar na outra vida, na conseqüente
perturbação que pode dilatar-se por meses e anos.
Naqueles que, ao
contrário, têm pura a consciência e na vida material já se acham identificados
com a vida espiritual, o trespasse é rápido, sem abalos, quase nula a turbação
de um pacífico despertar.
23º - Um fenômeno mui freqüente entre os
Espíritos de certa inferioridade moral é o acreditarem-se ainda vivos, podendo
esta ilusão prolongar-se por muitos anos, durante os quais eles experimentarão
todas as necessidades, todos os tormentos e perplexidades da vida.
24º -
Para o criminoso, a presença incessante das vitimas e das circunstâncias do
crime é um suplício cruel.
25º - Espíritos há mergulhados em densa treva;
outros se encontram em absoluto insulamento no Espaço, atormentados pela
ignorância da própria posição, como da sorte que os aguarda. Os mais culpados
padecem torturas muito mais pungentes por não lhes entreverem um
termo.
Alguns são privados de ver os seres queridos, e todos, geralmente,
passam com intensidade relativa pelos males, pelas dores e privações que a
outrem ocasionaram. Esta situação perdura até que o desejo de reparação pelo
arrependimento lhes traga a calma para entrever a possibilidade de, por eles
mesmos, pôr um termo à sua situação.
26º - Para o orgulhoso relegado às
classes inferiores. é suplício ver acima dele colocados, cheios de glória e
bem-estar, os que na Terra desprezara. O hipócrita vê desvendados, penetrados e
lidos por todo o mundo os seus mais secretos pensamentos, sem que os possa
ocultar ou dissimular; o sátiro, na impotência de os saciar, tem na exaltação
dos bestiais desejos o mais atroz tormento; vê o avaro o esbanjamento inevitável
do seu tesouro, enquanto que o egoísta, desamparado de todos, sofre as
conseqüências da sua atitude terrena; nem a sede nem a fome lhe serão mitigadas,
nem amigas mãos se lhe estenderão às suas mãos súplices; e pois que em vida só
de si cuidara, ninguém dele se compadecerá na morte.
27º - O único meio
de evitar ou atenuar as conseqüências futuras de uma falta, está no repará-la,
desfazendo-a no presente. Quanto mais nos demorarmos na reparação de uma falta,
tanto mais penosas e rigorosas serão, no futuro, as suas
conseqüências.
28º - A situação do Espírito, no mundo espiritual, não é
outra senão a por si mesmo preparada na vida corpórea.
Mais tarde, outra
encarnação se lhe faculta para novas provas de expiação e reparação, com maior
ou menor proveito, dependentes do seu livre-arbítrio; e se ele não se corrige,
terá sempre uma missão a recomeçar, sempre e sempre mais acerba, de sorte que
pode dizer-se que aquele que muito sofre na Terra, muito tinha a expiar; e os
que gozam uma felicidade aparente, em que pesem aos seus vícios e inutilidades,
paga-la-ão mui caro em ulterior existência. Nesse sentido foi que Jesus disse: -
"Bem-aventurados os aflitos, porque serão consolados," (O Evangelho segundo o
Espiritismo, cap. V.)
29º - Certo, a misericórdia de Deus é infinita, mas
não é cega. O culpado que ela atinge não fica exonerado, e, enquanto não houver
satisfeito à justiça, sofre a conseqüência dos seus erros. Por infinita
misericórdia, devemos ter que Deus não é inexorável, deixando sempre viável o
caminho da redenção.
30º - Subordinadas ao arrependimento e reparação
dependentes da vontade humana, as penas, por temporárias, constituem
concomitantemente castigos e remédios auxiliares à cura do mal. Os Espíritos, em
prova, não são, pois, quais galés por certo tempo condenados, mas como doentes
de hospital sofrendo de moléstias resultantes da própria incúria, a
compadecerem-se com meios curativos mais ou menos dolorosos que a moléstia
reclama, esperando alta tanto mais pronta quanto mais estritamente observadas as
prescrições do solícito médico assistente. Se os doentes, pelo próprio descuido
de si mesmos, prolongam a enfermidade, o médico nada tem que ver com
isso.
31º - As penas que o Espírito experimenta na vida espiritual
ajuntam-se as da vida corpórea, que são conseqüentes às imperfeições do homem,
às suas paixões, ao mau uso das suas faculdades e à expiação de presentes e
passadas faltas. z na vida corpórea que o Espírito repara o mal de anteriores
existências, pondo em prática resoluções tomadas na vida espiritual. Assim se
explicam as misérias e vicissitudes mundanas que, à primeira vista, parecem não
ter razão de ser. Justas são elas, no entanto, como espólio do passado - herança
que serve à nossa romagem para a perfectibilidade. (1)
(1) Vede 1ª'
Parte, cap. V, "O purgatório", nº 3 e seguintes; e, após, 2ª Parte, cap. VIII,
"Expiações terrestres". Vede, também, O Evangelho segundo o Espiritismo, cap. V,
"Bem-aventurados os aflitos".
32º - Deus, diz-se, não daria prova maior
de amor às suas criaturas, criando-as infalíveis e, por conseguinte, isentas dos
vícios inerentes à imperfeição? Para tanto fora preciso que Ele criasse seres
perfeitos, nada mais tendo a adquirir, quer em conhecimentos, quer em
moralidade. Certo, porém, Deus poderia fazê-lo, e se o não fez é que em sua
sabedoria quis que o progresso constituísse lei geral. Os homens são
imperfeitos, e, como tais, sujeitos a vicissitudes mais ou menos penosas. E pois
que o fato existe, devemos aceitá-lo.
Inferir dele que Deus não é bom nem
justo, fora insensata revolta contra a lei.
injustiça haveria, sim, na
criação de seres privilegiados, mais ou menos favorecidos, fruindo gozos que
outros porventura não atingem senão pelo trabalho, ou que jamais pudessem
atingir. Ao contrário, a justiça divina patenteia-se na igualdade absoluta que
preside à criação dos Espíritos; todos têm o mesmo ponto de partida e nenhum se
distingue em sua formação por melhor aquinhoado; nenhum cuja marcha progressiva
se facilite por exceção: os que chegam ao fim, têm passado, como quaisquer
outros, pelas fases de inferioridade e respectivas provas.
Isto posto,
nada mais justo que a liberdade de ação a cada qual concedida. O caminho da
felicidade a todos se abre amplo, como a todos as mesmas condições para
atingi-la. A lei, gravada em todas as consciências, a todos é ensinada. Deus fez
da felicidade o prêmio do trabalho e não do favoritismo, para que cada qual
tivesse seu mérito.
Todos somos livres no trabalho do próprio progresso,
e o que muito e depressa trabalha, mais cedo recebe a recompensa. O romeiro que
se desgarra, ou em caminho perde tempo, retarda a marcha e não pode queixar-se
senão de si mesmo.
O bem como o mal são voluntários e facultativos:
livre, o homem não é fatalmente impelido para um nem para outro.
33º - Em
que pese à diversidade de gêneros e graus de sofrimentos dos Espíritos
imperfeitos, o código penal da vida futura pode resumir-se nestes três
princípios:
1º - O sofrimento é inerente à imperfeição.
2º - Toda
imperfeição, assim como toda falta dela promanada, traz consigo o próprio
castigo nas conseqüências naturais e inevitáveis: assim, a moléstia pune os
excessos e da ociosidade nasce o tédio, sem que haja mister de uma condenação
especial para cada falta ou indivíduo.
3º - Podendo todo homem
libertar-se das imperfeições por efeito da vontade, pode igualmente anular os
males consecutivos e assegurar a futura felicidade.
A cada um segundo as
suas obras, no Céu como na Terra: - tal é a lei da Justiça Divina."
("O Céu e o Inferno", Allan Kardec)
quarta-feira, 31 de dezembro de 2014
terça-feira, 30 de dezembro de 2014
"CONFORTO"
"O
óleo e o perfume alegram o coração; assim o amigo encontra doçura ao conselho
cordial." Pv. 27:9
-o-o-o-
"O conforto é uma espécie de agasalho
para a alma, desde que não passe dos limites traçados pelo discernimento.
Dificilmente usas um bom perfume, sem ostentar uma cota de
satisfação.
-o-
A cordialidade, quando acompanha um
conselho nos moldes evangélicos, gera grande interesse no coração de quem ouve e
alegra a consciência de quem a transmite. São agentes invisíveis congêneres que
se permutam, de criatura para criatura.
-o-
O alento é um bálsamo que o coração
busca por inspiração, onde quer que seja. No entanto, é enobrecedor que, quando
consolado, oferta alguma coisa aos tristes e desesperados, para que ninguém
venha a dizer com razão que és amigo do egoísmo e parente da
usura.
-o-
Não deves ficar somente no consolo,
sem que outros participem do que sabes; lembra-te que ainda tens muito que
aprender. A sabedoria é infinita e o amor é sem
limites.
-o-
O conforto espiritual é ponto
dominante do coração, mas convém saber que o corpo físico não funciona bem, sem
harmonia nos órgãos.
-o-
Animação vem da esperança, e essa
oferece consolação, entretanto, é estipulado um preço no câmbio divino, que é o
auto aperfeiçoamento. Quem não se esforça, não
progride.
-o-
Dá lenitivo sem buscar refrigério,
que os céus nunca se esquecem do trabalhador desprendido que somente se
interessa pelo bem-estar da humanidade.
Quem doa sem esperar recompensa é
sempre recompensado por Deus.
-o-
O trabalhador honesto, manso e
cordial, recebe tudo de bom nos caminhos que percorre e, ainda mais, recebe o
reconforto das mãos daquele que tudo vê nos corações
benevolentes.
A consciência tranquila é o fruto do
diploma da alma.
-o-
Trabalhemos, pois, para o nosso
conforto, sem contudo esquecermos do bem-estar do próximo, porque sozinho
ninguém vive, mesmo com abundância de
tudo."
(“Gotas de Amor”, Carlos/João Nunes Maia)
segunda-feira, 29 de dezembro de 2014
"TRABALHEMOS TAMBÉM"
“E dizendo: Varões, por que fazeis essas coisas? Nós também somos homens como vós, sujeitos às mesmas paixões.” — (ATOS, CAPÍTULO 14, VERSÍCULO 15.)
"O grito de Paulo e Barnabé ainda repercute entre os aprendizes fiéis.
A família cristã muita vez há desejado perpetuar a ilusão dos habitantes de Listra.
Os missionários da Revelação não possuem privilégios ante o espírito de testemunho pessoal no serviço. As realizações que poderíamos apontar por graça ou prerrogativa especial, nada mais exprimem senão o profundo esforço deles mesmos, no sentido de aprender e aplicar com Jesus.
O Cristo não fundou com a sua doutrina um sistema de deuses e devotos, separados entre si; criou vigoroso organismo de transformação espiritual para o bem supremo, destinado a todos os corações sedentos de luz, amor e verdade.
No Evangelho, vemos Madalena arrastando dolorosos enganos, Paulo perseguindo ideais salvadores, Pedro negando o Divino Amigo, Marcos em luta com as próprias hesitações; entretanto, ainda aí, contemplamos a filha de Magdala, renovada no caminho redentor, o grande perseguidor convertido em arauto da Boa Nova, o discípulo frágil conduzido à glória espiritual e o companheiro vacilante transformado em evangelista da Humanidade inteira.
O Cristianismo é fonte bendita de restauração da alma para Deus.
O mal de muitos aprendizes procede da idolatria a que se entregam, em derredor dos valorosos expoentes da fé viva, que aceitam no sacrifício a verdadeira fórmula de elevação; imaginam-nos em tronos de fantasia e rojam-se-lhes aos pés, sentindo-se confundidos, inaptos e miseráveis, esquecendo que o Pai concede a todos os filhos as energias necessárias à vitória.
Naturalmente, todos devemos amor e respeito aos grandes vultos do caminho cristão; todavia, por isto mesmo, não podemos olvidar que Paulo e Pedro, como tantos outros, saíram das fraquezas humanas para os dons celestiais e que o Planeta Terreno é uma escola de iluminação, poder e triunfo, sempre que buscamos entender-lhe a grandiosa missão."
("Pão Nosso", Emmanuel/Francisco Cândido Xavier)
domingo, 28 de dezembro de 2014
"HONORABILIDADE"
"Estatuiu-se, na sociedade terrestre, que as conquistas de qualquer expressão exaltam o indivíduo e proporcionam-lhe honorabilidade e respeito. O progresso, portanto, atrela-se a qualidades morais, mesmo quando não exista qualquer correlação de identidade.
O desenvolvimento intelectual, a conquista de recursos econômicos, o destaque na Arte, na política, em qualquer que seja a área, produz respeitabilidade, honradez, e o seu portador passa a receber a bajulação dos parvos e dos aproveitadores, dos oportunistas sempre à espera de compensações. Entrementes, o progresso material nem sempre faz-se acompanhar daquele de natureza moral.
Nem todas as aquisições que deslumbram e projetam o ser humano têm procedência digna, sendo muitas assinaladas pela astúcia ou pela desonestidade, por métodos escusos ou heranças de procedência vergonhosa.
A honorabilidade resulta da vivência dos valores éticos adotados, dos costumes saudáveis, das condutas retas.
Mais facilmente se encontra nos sofredores a presença honrosa da dignidade, que constitui alicerce moral de segurança, sobre o qual são edificados os sentimentos de elevação e de paz, mesmo quando não existem os recursos aplaudidos pelos interesses da comunidade.
Considerando-se o hedonismo, o existencialismo e o individualismo que se estabeleceram como programas sociais da atualidade, não são de surpreender as ocorrências danosas que se instalam no comportamento geral com aspectos terríveis, avassaladores.
Violência, crimes de diversas ordens, rivalidades entre os indivíduos, traições, indiferenças pelo próximo e os seus problemas, constituem os frutos espúrios do comportamento ideológico da imensa maioria dos cidadãos do mundo.
Quando se lhes apresentam pautas morais de coragem ante as naturais vicissitudes, roteiros de elevação diante dos desafios evolutivos, propostas de dignificação e condutas éticas, são considerados fora de época, desequilíbrio mental, perturbação masoquista, porque estes são os dias para o prazer em que se deve beber a taça do consumo até as últimas gotas.
A princípio tem-se a impressão de que o licor da juventude e do estonteante gozo é absorvido até o momento quando esse conteúdo converte-se em fel e veneno, passando a destruir aqueles que o libam.
A filosofia dominante, eminentemente egotista, é a do ter mais e sempre mais, do destacar-se para aproveitar o momento fugaz até a exaustão.
Especialistas em atividades de divertimento e de sensações renovadas não se dão conta de que, enquanto elaboram planos de júbilos infindáveis, mais se acercam da desencarnação. Quando surpreendidos pelas enfermidades que alcançam a todos, pelos desencantos de algum insucesso, pelos acidentes orgânicos paralisantes e aqueles de outra natureza, não dispõem de resistência emocional para a sua administração.
Acreditam-se, inconscientemente, invulneráveis, inatingíveis pelo sofrimento que somente elege os outros, a ponto de viverem anestesiados em relação aos valores existenciais e à fragilidade de que se constitui o ocaso carnal no qual se encontram.
Quanta ilusão nos propósitos de viver apenas para desfrutar!
É natural que todos os seres humanos anelem pela felicidade. O fundamental, no entanto, é saber-se em que a mesma consiste. Ignorando-se o de que se constitui, abraçam-se as sensações fortes, o armamento preventivo contra a solidariedade, a fim de não se exporem, e fogem sempre na busca da alegria que não deve cessar. Alcançando-a, não se dão conta de como é rápida a sua presença na emoção, logo cedendo lugar à ânsia de novos e incessantes júbilos.
O corpo, porém, não está programado somente para as sensações, mas sobretudo para as emoções e, quando essas se derivam do exterior, abrem espaço para o vazio existencial, para a sensação de inutilidade.
A felicidade, sem dúvida, é emoção profunda e duradoura de plenitude que o Espírito vivencia quando consegue conciliar a consciência tranquila como resultado do caráter íntegro e das emoções pacificadoras.
Honoráveis são todos aqueles que conseguem superar as más inclinações e se dignificam no esforço da autoiluminação.
Nesse sentido, a oferta de Jesus, desde há quase dois mil anos, diz respeito à imortalidade e não apenas à maneira como deve ocorrer o trânsito carnal que passa célere, mas tem como objetivo essencial trabalhar-se em favor do futuro espiritual inevitável.
É natural que se aspirem pelas alegrias, comodidades, satisfações, bem-estares. Isto, porém, resultará das condutas mentais que dão lugar aos acontecimentos que se desenrolam durante a existência.
Transferindo-se de uma para outra reencarnação, as realizações apresentam-se em novas formulações que são os desafios evolutivos para serem enfrentados e superados.
As distrações e fugas do dever não conseguem impedir que, no momento próprio, apresentem-se como impositivos inevitáveis para acontecerem.
A consciência lúcida em torno da imortalidade propicia inefável alegria, por facultar os meios hábeis para o comportamento nos momentos difíceis da reabilitação moral.
Ninguém existe que possa impedir o despertar para a realidade, fenômeno resultante da sucessão do tempo que impõe amadurecimento psicológico, porquanto, qualquer fuga, em vez de libertar do compromisso, mais o complica e o adia, para ressurgir à frente.
Não te escuses ao chamado pela dor para a conquista da honorabilidade.
Se conheces algo da doutrina de Jesus, sabes que ela é um hino de louvor à vida e uma exaltação contínua ao amor em todas as facetas em que se apresente.
Reflexiona em torno de como te encontras e o que podes fazer para alcançar a meta que te está destinada: a perfeição relativa, o estado de reino dos Céus na mente e no coração.
Honoráveis foram os mártires de todo jaez, que não temeram o sacrifício, inclusive, o da própria existência.
Todo aquele que transforma a existência em um evangelho de amor no reto cumprimento do dever torna-se honorável.
Esforça-te para entender a finalidade existencial e segue, firme e abnegado, a trilha do teu compromisso para com a vida."
(Joanna de Ângelis - Psicografia de Divaldo Pereira Franco, na sessão mediúnica de 6 de agosto de 2014, no Centro Espírita Caminho da Redenção, em Salvador, Bahia)
sábado, 27 de dezembro de 2014
"OLÁ, MEU IRMÃO"
"— A disposição amiga — acentuava Cipriano Neto — é verdadeiro tônico espiritual. Não raro, envenenamos o coração, à força de insistir na máscara sombria. Má catadura é moléstia perigosa, porquanto as enfermidades não se circunscrevem ao corpo físico.
Quantos negócios de muletas, quantas atividades nobres interrompidas, em virtude do mau humor dos responsáveis? Claro que ninguém se deixe absorver pelos malandros de esquina, mas o respeito e a afabilidade para com as criaturas honestas, seja onde for, constituem alguma coisa de sagrado, que não esqueceremos sem ferir a nós mesmos.
À frente da pequena assembléia, toda ouvidos, Cipriano, com a graça de sua privilegiada inteligência, continuou, após leve pausa:
— Na Terra, o preconceito fala muito alto, abafando vozes sublimes da realidade superior.
Nesse capítulo, tenho a minha experiência pessoal, bastante significativa.
Meu amigo calou-se, por alguns momentos, vagueou o olhar muito lúcido, através do horizonte longínquo, como a vasculhar o passado, e prosseguiu:
— É quase inacreditável, mas o meu fracasso em Espiritismo não teve outra causa. Não ignoram vocês que meu coração de pai, dilacerado pela morte do filho querido, fora convocado à Doutrina dos Espíritos, ansioso de esclarecimento e consolação. Banhado de conforto sublime, senti que minhas lágrimas de desesperação se transformaram em orvalho de agradecimento à bondade de Deus. Meu filho não morrera. Mais vivo que nunca, endereçava-me carinhosas palavras de amor. Identificara-se de mil modos. Não havia lugar à dúvida. Inclinei-me, então, à Doutrina renovadora. Saciado pela água viva de santas consolações, não sabia como agradecer à fonte. Foi aí que recordei as minhas possibilidades intelectuais. Não seria justo servir ao Espiritismo, através da palavra ou da
pena? Poderia escrever para os jornais ou falar em público. Profundamente reconhecido à nova fé, atendi à primeira sugestão de um amigo e dispus-me a fazer uma conferência.
Anunciou-se o feito e, no dia aprazado, compacta assistência esperou-me a confissão.
Seduzido pela beleza do Espiritismo Evangélico, discorri longamente sobre a caridade.
Aplausos, abraços, sorrisos e felicitações. No círculo dos meus companheiros de literatura, porém, o assunto fizera-se obrigatório. Voltando à Avenida, no dia imediato ao acontecimento, meu esforço foi árduo para convencer os confrades de letras de que não me achava louco. Infelizmente, porém, minha decisão não se filiava senão à vaidade.
Pronunciara a conferência como se o Espiritismo necessitasse de mim. Admitia, no fundo, que minha presença honrara, sobremaneira, o auditório e que a codificação kardequiana em mim encontrara prestigioso protetor. Desse modo, alardeava suma importância em minhas palestras novas. Citava a antigüidade clássica, recorria aos grandes filósofos, mencionava cientistas modernos. Quando nos encontrávamos, meus colegas e eu, no ápice das discussões preciosas, eis que surge o Elpídio, velho conhecido meu e antigo tintureiro em Jacarepaguá. Sapatos rotos, calças remendadas, cabelos despenteados, rosto suarento, abeirou-se de mim e estendeu-me a destra, exclamando alegre:
— Olá, meu irmão! Meus parabéns!... Fiquei muito satisfeito com a sua conferência!
Entreolharam-se os meus amigos, admirados.
E confesso que respondi à saudação efusiva, secamente, meneando levemente a cabeça e sentindo-me deveras humilhado.
Em vista do meu silêncio, o tintureiro despediu-se, mostrando enorme desapontamento.
— “É de sua família?” — indagou um companheiro mais irônico.
— “Estes senhores espiritistas são os campeões da ingenuidade!” — exclamou outro circunstante.
Enraiveci-me. Não era desaforo semelhante homem do povo chamar-me “irmão”, ali, em plena Avenida, diante dos colegas de tertúlias acadêmicas? Estaria, então, obrigado a relacionar-me com toda espécie de vagabundos? Não seria aquilo irmanar-me a rebotalhos de gente, na via pública?
O incidente criou em mim vasto complexo de inferioridade.
Cegavam-me, ainda, velhos preconceitos sociais e a ironia dos companheiros calou-me fundo, no espírito. A ausência de afabilidade e a incompreensão grosseira dominaram-me por completo. O fermento da negação trabalhou-me o íntimo, levedando a massa de minhas disposições mentais. Resultado? Voltei à aspereza antiga e, se cuidava de doutrina, confinava-me a reduzido círculo doméstico. Não estimava a companhia ou a intimidade daqueles que considerava inferiores. Os anos, todavia, correm metodicamente, alheios à nossa vaidade e ignorância, e impuseram-me a restituição do organismo cansado ao seio acolhedor da terra. Sabem vocês, por experiência própria, o que nos acontece a essa altura da existência humana. Gritos estentóricos de familiares, pavor de afeiçoados, ataúde a
recender aromas de flores das convenções sociais. Em meio da perturbação geral, senti que sono brando se apoderava de mim. Nunca pude saber quantos dias gastei no repouso compulsório. Despertando, porém, debalde clamei por meu filho bem-amado. Sabia perfeitamente que abandonara a esfera carnal e ansiava por reencontrar-lhe o carinho.
Deixei a residência antiga, ferido de amargosas preocupações. Atravessei ruas e praças, de alma opressa. Atingi a Avenida, onde me dava ao luxo de palestrar sobre ciência e literatura.
E ali mesmo, junto ao aristocrático Café, divisei alguém que não me era estranho às relações individuais. Não tive dificuldades no reconhecimento. Era o Elpídio, integralmente transformado, evidenciando nobre posição espiritual, trocando idéias com outras entidades da vida superior. Não mais os sapatos velhos, nem o rosto suarento, mas singular aprumo, aliado a expressão simpática e bela, cheia de bondade e compreensão.
Aproximei-me, envergonhado. Quis dizer qualquer coisa que me revelasse a angústia, mas, obedecendo a impulso que eu jamais soube explicar, apenas pude repetir as antigas palavras dele:
— “Olá, meu irmão! Meus parabéns!”
Longe, todavia, de imitar-me o gesto grosseiro e tolo de outro tempo, o generoso tintureiro de Jacarepaguá abriu-me os braços, contente, e exclamou com sincera alegria:
— Ó meu amigo, que satisfação! Venha daí, vou conduzi-lo ao seu filho!
Aquela bondade espontânea, aquele fraternal esquecimento de minha falta eram por demais eloqüentes e não pude evitar as lágrimas copiosas!...
Nossa pequena assembléia de desencarnados achava-se igualmente comovida. Cipriano calou-se, enxugou os olhos úmidos e terminou:
— A experiência parece demasiadamente humilde; entretanto, para mim, representou lição das mais expressivas. Através dela, fiquei sabendo que a afabilidade é mais que um dever social, é alguma coisa de Deus que não subtrairemos ao próximo, sem prejudicar a nós mesmos."
("Pontos e Contos", Irmão X/Francisco Cândido Xavier)
Quantos negócios de muletas, quantas atividades nobres interrompidas, em virtude do mau humor dos responsáveis? Claro que ninguém se deixe absorver pelos malandros de esquina, mas o respeito e a afabilidade para com as criaturas honestas, seja onde for, constituem alguma coisa de sagrado, que não esqueceremos sem ferir a nós mesmos.
À frente da pequena assembléia, toda ouvidos, Cipriano, com a graça de sua privilegiada inteligência, continuou, após leve pausa:
— Na Terra, o preconceito fala muito alto, abafando vozes sublimes da realidade superior.
Nesse capítulo, tenho a minha experiência pessoal, bastante significativa.
Meu amigo calou-se, por alguns momentos, vagueou o olhar muito lúcido, através do horizonte longínquo, como a vasculhar o passado, e prosseguiu:
— É quase inacreditável, mas o meu fracasso em Espiritismo não teve outra causa. Não ignoram vocês que meu coração de pai, dilacerado pela morte do filho querido, fora convocado à Doutrina dos Espíritos, ansioso de esclarecimento e consolação. Banhado de conforto sublime, senti que minhas lágrimas de desesperação se transformaram em orvalho de agradecimento à bondade de Deus. Meu filho não morrera. Mais vivo que nunca, endereçava-me carinhosas palavras de amor. Identificara-se de mil modos. Não havia lugar à dúvida. Inclinei-me, então, à Doutrina renovadora. Saciado pela água viva de santas consolações, não sabia como agradecer à fonte. Foi aí que recordei as minhas possibilidades intelectuais. Não seria justo servir ao Espiritismo, através da palavra ou da
pena? Poderia escrever para os jornais ou falar em público. Profundamente reconhecido à nova fé, atendi à primeira sugestão de um amigo e dispus-me a fazer uma conferência.
Anunciou-se o feito e, no dia aprazado, compacta assistência esperou-me a confissão.
Seduzido pela beleza do Espiritismo Evangélico, discorri longamente sobre a caridade.
Aplausos, abraços, sorrisos e felicitações. No círculo dos meus companheiros de literatura, porém, o assunto fizera-se obrigatório. Voltando à Avenida, no dia imediato ao acontecimento, meu esforço foi árduo para convencer os confrades de letras de que não me achava louco. Infelizmente, porém, minha decisão não se filiava senão à vaidade.
Pronunciara a conferência como se o Espiritismo necessitasse de mim. Admitia, no fundo, que minha presença honrara, sobremaneira, o auditório e que a codificação kardequiana em mim encontrara prestigioso protetor. Desse modo, alardeava suma importância em minhas palestras novas. Citava a antigüidade clássica, recorria aos grandes filósofos, mencionava cientistas modernos. Quando nos encontrávamos, meus colegas e eu, no ápice das discussões preciosas, eis que surge o Elpídio, velho conhecido meu e antigo tintureiro em Jacarepaguá. Sapatos rotos, calças remendadas, cabelos despenteados, rosto suarento, abeirou-se de mim e estendeu-me a destra, exclamando alegre:
— Olá, meu irmão! Meus parabéns!... Fiquei muito satisfeito com a sua conferência!
Entreolharam-se os meus amigos, admirados.
E confesso que respondi à saudação efusiva, secamente, meneando levemente a cabeça e sentindo-me deveras humilhado.
Em vista do meu silêncio, o tintureiro despediu-se, mostrando enorme desapontamento.
— “É de sua família?” — indagou um companheiro mais irônico.
— “Estes senhores espiritistas são os campeões da ingenuidade!” — exclamou outro circunstante.
Enraiveci-me. Não era desaforo semelhante homem do povo chamar-me “irmão”, ali, em plena Avenida, diante dos colegas de tertúlias acadêmicas? Estaria, então, obrigado a relacionar-me com toda espécie de vagabundos? Não seria aquilo irmanar-me a rebotalhos de gente, na via pública?
O incidente criou em mim vasto complexo de inferioridade.
Cegavam-me, ainda, velhos preconceitos sociais e a ironia dos companheiros calou-me fundo, no espírito. A ausência de afabilidade e a incompreensão grosseira dominaram-me por completo. O fermento da negação trabalhou-me o íntimo, levedando a massa de minhas disposições mentais. Resultado? Voltei à aspereza antiga e, se cuidava de doutrina, confinava-me a reduzido círculo doméstico. Não estimava a companhia ou a intimidade daqueles que considerava inferiores. Os anos, todavia, correm metodicamente, alheios à nossa vaidade e ignorância, e impuseram-me a restituição do organismo cansado ao seio acolhedor da terra. Sabem vocês, por experiência própria, o que nos acontece a essa altura da existência humana. Gritos estentóricos de familiares, pavor de afeiçoados, ataúde a
recender aromas de flores das convenções sociais. Em meio da perturbação geral, senti que sono brando se apoderava de mim. Nunca pude saber quantos dias gastei no repouso compulsório. Despertando, porém, debalde clamei por meu filho bem-amado. Sabia perfeitamente que abandonara a esfera carnal e ansiava por reencontrar-lhe o carinho.
Deixei a residência antiga, ferido de amargosas preocupações. Atravessei ruas e praças, de alma opressa. Atingi a Avenida, onde me dava ao luxo de palestrar sobre ciência e literatura.
E ali mesmo, junto ao aristocrático Café, divisei alguém que não me era estranho às relações individuais. Não tive dificuldades no reconhecimento. Era o Elpídio, integralmente transformado, evidenciando nobre posição espiritual, trocando idéias com outras entidades da vida superior. Não mais os sapatos velhos, nem o rosto suarento, mas singular aprumo, aliado a expressão simpática e bela, cheia de bondade e compreensão.
Aproximei-me, envergonhado. Quis dizer qualquer coisa que me revelasse a angústia, mas, obedecendo a impulso que eu jamais soube explicar, apenas pude repetir as antigas palavras dele:
— “Olá, meu irmão! Meus parabéns!”
Longe, todavia, de imitar-me o gesto grosseiro e tolo de outro tempo, o generoso tintureiro de Jacarepaguá abriu-me os braços, contente, e exclamou com sincera alegria:
— Ó meu amigo, que satisfação! Venha daí, vou conduzi-lo ao seu filho!
Aquela bondade espontânea, aquele fraternal esquecimento de minha falta eram por demais eloqüentes e não pude evitar as lágrimas copiosas!...
Nossa pequena assembléia de desencarnados achava-se igualmente comovida. Cipriano calou-se, enxugou os olhos úmidos e terminou:
— A experiência parece demasiadamente humilde; entretanto, para mim, representou lição das mais expressivas. Através dela, fiquei sabendo que a afabilidade é mais que um dever social, é alguma coisa de Deus que não subtrairemos ao próximo, sem prejudicar a nós mesmos."
("Pontos e Contos", Irmão X/Francisco Cândido Xavier)
sexta-feira, 26 de dezembro de 2014
"SOMBRA"
"Não é o ouro que avilta.
É a sombra do egoísmo em forma de
avareza.
Não é a propriedade que
encarcera.
É a sombra do egoísmo em forma de
ambição.
Não é o poder que perturba.
É a sombra do egoísmo em forma de
tirania.
Não é a afeição que degrada.
É a sombra
do egoísmo em forma de violência.
Não é a autoridade que
envilece.
É a forma de egoísmo em forma de
opressão.
Não é o ponto de vista que
isola.
É a sombra do egoísmo em forma de
intolerância.
Não é o descanso que prejudica.
É a sombra do egoísmo em forma de
ociosidade.
Não é a despesa que arruína.
É a sombra do egoísmo em forma de
excesso.
Lícita é a lei do uso, em todas as províncias da vida,
mas,
em todas as províncias da vida, a lei
do uso pede simplicidade e
ponderação.
A árvore que produz milhares de frutos absorve da gleba
tão-somente o indispensável à própria
existência.
O rio, que fecunda o solo, transpondo léguas e léguas
para
atingir o oceano, satisfaz-se com a
faixa de terra em que se lhe
demarca o leito
preciso.
Na sustentação da própria felicidade, aprendamos a tomar
do
mundo apenas o necessário à paz da
consciência tranquila, no
cumprimento exato o dever que as
circunstâncias nos assinalam,
porque, se o amor desinteressado é a
luz de Deus a envolver-nos,
em toda a parte, o egoísmo, seja onde
for, é a sombra de nosso
espírito endividado,
enquistando-nos alma e sonho na carapaça do
“eu”."
(Emmanuel, na obra “Passos da Vida”, Francisco
Cândido Xavier/ Espíritos Diversos)
quinta-feira, 25 de dezembro de 2014
"INFLUÊNCIAS"
"Queixas-te de influências perniciosas que te desgastam a vida.
Alegas que espíritos sofredores te
vampirizam as horas e que obsessores te viciam os pensamentos.
-o-
E, muitas vezes, a cada dia,
experimentas tensão e desespero, cólera e enfermidade.
-o-
Para conjurar o perigo, recorres à
oração e aos conselhos edificantes.
Tais medidas, no entanto, não
obstante providenciais, podem ser comparadas às receitas médicas que, apesar de
preciosas, passam despercebidas, se os recursos indicados não forem usados
conforme as prescrições.
-o-
Isso equivale dizer que os agentes
externos são necessários à nossa própria preservação contra os males que nos
atormentam, entretanto, se nos propomos realmente a vencê-los, analisemos a
nossa posição individual no campo das influências.
-o-
Se sabemos marcar os que nos ferem,
aqueles aos quais ferimos igualmente podem marcar—nos.
-o-
Aos que nos sugiram algo, algo
conseguiremos também sugerir.
-o-
A solução do problema, em matéria e
influências nocivas, será alcançada se criarmos a força e a sugestão do bem no
ambiente menos desejável que nos rodeie.
-o-
Para isso é preciso que o
entendimento e a união se façam ingredientes essenciais de nossa própria
atitude.
-o-
Não temos necessidade de recear as
influências chamadas perniciosas, porquanto, se outros nos influenciam o
caminho, também nós desfrutamos a possibilidade influenciar o caminho
alheio.
E estamos convencidos de que tudo
aquilo que doarmos aos nossos irmãos para nós voltará."
(“Neste instante”, Emmanuel/Francisco Cândido
Xavier)
quarta-feira, 24 de dezembro de 2014
"ENCONTRO DE NATAL"
"Recolhes as melodias do Natal, guardando o pensamento engrinaldado pela ternura de harmoniosa canção.
Percebes que o céu te chama a partilhar os júbilos da exaltação do Senhor nas sombras do mundo.
Entretanto, misturada ao regozijo que te acalenta a esperança, carregas a névoa sutil de recôndita angústia, como se trouxesses no peito um canteiro de rosas orvalhado de lágrimas!...
É que retratas no espelho da própria emoção o infortúnio de tantos outros companheiros que foram inutilmente convidados para a consagração da alegria. Levantaste no lar a árvore da ventura doméstica, de cujos galhos pendem os frutos do carinho perfeito, entretanto, não longe, cambaleiam seguidores de Jesus, suspirando por leve proteção que os resguarde contra o frio da noite; banqueteias-te, sob guirlandas festivas, mas, a poucos passos da própria casa, mães e crianças desprotegidas, aguardando o socorro de Cristo, enlanguecem de fadiga, e necessidade; repetes hinos comovedores, tocados pela serena beleza que dimana dos astros, entretanto, nas vizinhança, cooperadores humildes do Mestre, choram cansados de penúria e aflição; abraças os entes queridos, desfrutando excesso de conforto, contudo, à pequena distância, esmorecem amigos de Jesus, implorando que Ihes dê a benção de uma prece e o consolo de uma palavra afetuosa, nas grades dos manicômios ou no leito dos hospitais...
Sim, quando refletes na glória da Manjedoura, sentes, em verdade, a presença do Cristo no coração!
Louva as doações divinas que te felicitam a existência, mas não te esqueças de que o Natal é o Céu que se reparte com a Terra, através do eterno amor que se derramou das estrelas.
Agradece o dom inefável da paz que volta, de novo, enriquecendo-te a vida, mas divide a própria felicidade, realizando, em nome do Senhor, a alegria de alguém!.."
("O Espírito da Verdade", Meimei/Francisco Cândido Xavier)
terça-feira, 23 de dezembro de 2014
"A MANJEDOURA"
"As comemorações do Natal conduzem-nos o entendimento à eterna lição de humildade de Jesus, no momento preciso em que a sua mensagem de amor felicitou o coração das criaturas, fazendo-nos sentir, ainda, o sabor de atualidade dos seus divinos ensinamentos.A Manjedoura foi o Caminho.A exemplificação era a Verdade.O Calvário constituía a Vida.Sem o Caminho, o homem terrestre não atingirá os tesouros da Verdade e da Vida.É por isso que, emaranhados no cipoal da ambição menos digna, os povos modernos, perdendo o roteiro da simplicidade cristã, desgarra-se da estrada que os conduziria à evolução definitiva, com o Evangelho do Senhor.Sem Ele, que constitui o transunto de todas as ciências espirituais, perderam-se as criaturas humanas, nos desfiladeiros escabrosos da impiedade.Debalde, invoca-se o prestígio das religiões numerosas, que se afastaram da Religião Única, que é a Verdade ou a Exemplificação com o Cristo.Com as doutrinas da Índia, mesmo no seio de suas filosofias mais avançadas, vemos os párias miseráveis morrendo de fome, à porta suntuosa dos pagodes de ouro das castas privilegiadas.Com o budismo e com o sintoísmo, temos o Japão e a China mergulhados num oceano de metralha e de sangue.Com o Alcorão e com o judaísmo, temos as nefandas disputas da Palestina.Com o catolicismo, que mais de perto deveria representar o pensamento evangélico, na civilização ocidental, vemos basílicas sunptuosas e frias, onde já se extinguiram quase todas as luzes da fé. Aí dentro, com os requintes da ciência sem consciência e do raciocínio sem coração, assistimos as guerras absurdas da conquista pela força, identificamos o veneno das doutrinas extremistas e perversoras, verificamos a onda pesada de sangue fratricida, nas revoluções injustificáveis, e anotamos a revivescência das perseguições inquisitórias da Idade Média, com as mais sombrias perspectivas de destruição.Um sopro de morte atira ao mundo atual supremo cartel de desafio.Não obstante o progresso material sente a alma humana que sinistros vaticínios lhe pesam sobre a fronte. É que a tempestade de amargura na dolorosa transição do momento significa que o homem se mantém muito distante da Verdade e da Vida.As lembranças do Natal, porém, na sua simplicidade, indicam à Terra o caminho da Manjedoura...Sem Ele, os povos do mundo não alcançarão as fontes regeneradoras da fraternidade e da paz.Sem Ele, tudo será perturbação e sofrimento nas almas, presas no turbilhão das trevas angustiosas, porque essa estrada providencial para os corações humanos é ainda o Caminho esquecido da Humildade."
(Emmanuel, na obra "Antologia Mediúnica do Natal" , Autores Diversos/Francisco Cândido Xavier)
segunda-feira, 22 de dezembro de 2014
"ATUALIDADE DO NATAL"
"Andando
sem rumo, sob o flagício de mil aflições, o homem moderno deixa-se dominar pelo
desânimo ou pela ansiedade, malbaratando o valioso contributo da inteligência e
do sentimento com que a vida o enriqueceu, exaurindo-se, ora no consumismo
insensato, ora na revolta desastrada por falta de recursos econômicos ou
emocionais para realizar-se.
A
insatisfação é a tônica do comportamento individual e social que vige na
Terra.
Aqueles
indivíduos que experimentam carência de qualquer natureza lamentam-se e
rebolcam-se na rebeldia, que degenera em violência, enquanto aqueloutros que se
encontram afortunados, deixam-se dominar pelas extravagâncias ou pelo tédio,
derrapando, uns e outros, nas viciações perturbadoras ou na dependência de
substâncias químicas de funestas conseqüências.
As
admiráveis conquistas da Ciência e da Tecnologia não os tornaram mais felizes
nem menos tensos, pelo contrário, empurraram-nos na direção trágica da
neurastenia ou da depressão nas quais estorcegam.
Indubitavelmente
trouxeram incomparável ajuda para a solução de diversos sofrimentos e situações
penosas, de progresso rnateriall e social, porém, não conseguiram penetrar o
cerne dos seres humanos, modificando-lhes as disposições íntimas em relação à
existência terrena e aos seus objetivos essenciais.
Considerando
a vida apenas do ponto de vista material, sem as conseqüentes avaliações em
torno do Espírito imortal, o comportamento materialista domina as mentes e os
corações, que acreditam na felicidade em forma de valores amoedados, satisfações
dos sentidos, destaque social e harmonia física...
Vive-se
o apogeu da glória tecnológica diante dos descalabros comportamentais que
jugulam os seres humanos aos estados primevos da evolução.
Há
conquistas do Infinito sem realização pessoal, sorrisos de triunfo sem
sustentação de felicidade, que logo se transformam em esgares, situações
invejáveis mas alicerçadas na miséria, na doença e no desconforto das pessoas
excluídas...
Faltando-lhes,
porém, a vivência dos compromissos ético-morais, logo se lhes apresentam os
desapontamentos íntimos, e os conflitos se lhes instalam
devoradores.
Uma
tormenta inigualável paira nos céus da sociedade moderna, ameaçando-a com
tragédias inomináveis.
*
Em
período idêntico, no passado, salvadas as distâncias compreensíveis, veio Jesus
à Terra.
O
mundo encontrava-se conturbado pelo poder mentiroso, pela falácia dos
dominadores, pelas ambições desmedidas, pelas conquistas arbitrárias, pelas
ilusões tresvariadas...
Predominavam
o luxo e a ostentação em alguns segmentos da humanidade, enquanto nos porões do
abandono em que desfaleciam, incontáveis criaturas espiavam angustiadas o passar
do tufão devorador...
Apareceu
Jesus, e una aragem abençoada varreu o mundo, modificando-lhe a
psicosfèra.
Sua
voz levantou-se para profligar contra o crime e a insensatez, contra a
indiferença dos fortes em relação aos seus irmãos mais fracos, contra a
hipocrisia e o egoísmo então vigentes e dominantes como hoje
ocorrem......
Misturando-se
aos mutilados do corpo e da alma, ergueu-os do pó em que se asfixiavam,
conduzindo-os na direção da glória estelar, demonstrando-lhes que a vida física
é experiência transitória, e que os valores reais são os que pertencem ao
Espírito imortal.
Utilizou-se
da cátedra da Natureza e ensinou a fèlicidade mediante o desapego e o
despojamento das alucinantes prisões às coisas e às paixões
materiais.
Cantou
a esperança aos ouvidos da angústia e proporcionou a saúde temporária a quantos
se Lhe acercaram, alentando-os com a certeza da plenitude após vencidas as
etapas de regeneração e de resgate que todos os seres se impõem no processo da
evolução.
Atendeu
a dor de todos os matizes, defendeu os pobres e oprimidos, os esfaimados e
sedentos de justiça, a quem ofereceu os preciosos recursos de paz. No entanto,
quando acusado, abandonado, marchando para o testemunho, elegeu o silêncio, a
submissão à vontade de Deus, a fim de ensinar pelo exemplo resignação e
misericórdia para com os maus e perversos, confirmando a indiferença pelos
valores do mundo físico destituídos de utilidade
...
E permanece até hoje como o Triunfador não conquistado, que prossegue alentando
os padecentes, convocando-os à transformação moral para a conquista dos
imperecíveis tesouros internos do amor, do perdão, da caridade, da
paz...
*
Recorda-te
de Jesus neste Natal e reaproxima--te dEle, analisando como te encontras e de
que forma deverias estar moralmente, conscientizando-te do que já fizeste e de
quanto ainda podes e deves investir em favor de ti mesmo e do teu próximo mais
próximo, no lar, na rua, na humanidade...
O
Natal é presença constante do amor e do bem na atualidade de todos os
tempos.
Não
te esqueças que a evocação do nascimento do Excelente Filho de Deus entre as
criaturas humanas, é um convite para que O permitas renascer no teu íntimo, se
estiver desaparecido da tua emoçao, ou prosseguir vivo e atuante nos teus
sentimentos, convidados à construção da solidariedade, do dever e da lídima
fraternidade que deve viger entre todos os seres sencientes que vagueiam no
Planeta .
...
E deixa que Jesus te fale novamente à acústica do coração e aos escaninhos da
mente, repetindo-te o poema imortal das Bem -aventuranças."
(Franco,
Divaldo Pereira. Pelo Espírito Joanna de Ângelis. Página psicografada pelo
médium Divaldo P. Franco, no dia 20 de setembro de 2002, no Centro Espírita
Caminho da Redenção, em Salvador, Bahia)
domingo, 21 de dezembro de 2014
"O ANJO DA LIMPEZA"
"Adélia ouvira falar em Jesus e tomara-se de tamanha paixão pelo Céu que nutria um desejo único — ser anjo para servir ao Divino Mestre.
Para isso, a boa menina fez-se humilde e crente, e, quando se não achava na escola em contacto com os livros, mantinha-se na câmara de dormir em preces fervorosas.
Cercava-se de lindas gravuras, em que os artistas do pincel lembram a passagem do Cristo entre os homens, e, em lágrimas, repetia: — “Senhor, quero ser tua! quero servir-te!...”
A Mãezinha, em franca luta doméstica, embalde convidava-a aos serviços da casa.
Adélia sorria, abraçava-se a ela e reafirmava o propósito de preparar-se para a companhia do Divino Amigo.
A bondosa senhora, observando que o ideal da filha só merecia louvores, deixava-a em paz com os estudos e orações de cada dia.
Meses correram sobre meses e a jovem prosseguia inalterável.
Orando sempre, suplicava ao Senhor a transformasse num anjo.
Decorridos dois anos de rogativas, sonhou, certa noite, que era visitada pelo Mestre Amoroso.
Jesus envolvia-se em vasta auréola de claridade sublime. A túnica luminosa, a cair-lhe dos ombros com graça e beleza, parecia de neve coroada de sol.
Estendendo-lhe a destra compassiva, o Cristo observou-lhe:
— Adélia, ouvi tuas súplicas e venho ao teu encontro. Desejas realmente servir-me?
— Sim, Senhor! — respondeu a pequena, inflamada de comoção jubilosa, convencida de que o Salvador a conduziria naquele mesmo instante para o Céu.
— Ouve! — tornou o Mestre, docemente.
Ansiosa de pôr-se a caminho do paraíso, a jovem replicou, reverente:
— Dize, Senhor! estou pronta!... Leva-me contigo, sinto-me aflita para comparecer entre os que retêm a glória de servir-te no plano celestial!...
O Cristo sorriu, bondoso, e considerou:
— Não, Adélia. Nosso Pai não te colocou inutilmente na Terra. Temos enorme serviço neste mundo mesmo. Estimo tuas preces e teus pensamentos de amor, mas preciso de alguém que me ajude a retirar o lixo e os detritos que se amontoam, não longe de tua casa. Meninos Cruéis prejudicaram a rede de esgoto, a pequena distância do teu lar. Aí se concentra perigoso foco de moléstias, ameaçando trabalhadores desprevenidos, mães devotadas e crianças incautas. Vai, minha filha! Ajuda-me a salvá-los da morte. Estarei contigo, auxiliando-te nessa meritória tarefa.
A menina preocupada quis fazer perguntas, mas o Mestre afastou-se, de leve...
Acordou sobressaltada.
Era dia.
Vestiu-se à pressa e procurou a zona indicada. Corajosa muniu-se de desinfetantes, armou-se de enxada e vassoura pediu a contribuição materna, e o foco infeccioso foi extinto.
A discípula obediente, todavia, não parou mais.
Diariamente, ao regressar da escola, punha-se a colaborar com a Mamãe, em casa, zelando também quanto lhe era Possível pela higiene das vias públicas e ensinando outras crianças a serem tão Cuidadosas, quanto ela mesma. Tanto trabalhou e se esforçou que, certo dia, o diretor do grupo escolar lhe conferiu o título de Anjo da Limpeza. Professoras e colegas comemoraram festivamente o acontecimento.
Chegada a noite, dormiu contente e sonhou que Jesus vinha encontrá-la, de novo.
Nimbado de luz, abraçou-a, com ternura, e disse-lhe brandamente:
— Abençoada sejas, filha minha! agora, que os próprios homens te reconhecem por benfeitora, agradeço-te os serviços que me prestas diariamente. Anjo da Limpeza na Terra, serás Anjo de Luz no Paraíso.
Em lágrimas de alegria intensa, Adélia despertou, feliz, compreendendo, cada vez mais, que a verdadeira ventura reside em colaborar com o Senhor, nos trabalhos do bem, em toda parte."
("Alvorada Cristã", Neio Lúcio/Francisco Cândido Xavier)
Para isso, a boa menina fez-se humilde e crente, e, quando se não achava na escola em contacto com os livros, mantinha-se na câmara de dormir em preces fervorosas.
Cercava-se de lindas gravuras, em que os artistas do pincel lembram a passagem do Cristo entre os homens, e, em lágrimas, repetia: — “Senhor, quero ser tua! quero servir-te!...”
A Mãezinha, em franca luta doméstica, embalde convidava-a aos serviços da casa.
Adélia sorria, abraçava-se a ela e reafirmava o propósito de preparar-se para a companhia do Divino Amigo.
A bondosa senhora, observando que o ideal da filha só merecia louvores, deixava-a em paz com os estudos e orações de cada dia.
Meses correram sobre meses e a jovem prosseguia inalterável.
Orando sempre, suplicava ao Senhor a transformasse num anjo.
Decorridos dois anos de rogativas, sonhou, certa noite, que era visitada pelo Mestre Amoroso.
Jesus envolvia-se em vasta auréola de claridade sublime. A túnica luminosa, a cair-lhe dos ombros com graça e beleza, parecia de neve coroada de sol.
Estendendo-lhe a destra compassiva, o Cristo observou-lhe:
— Adélia, ouvi tuas súplicas e venho ao teu encontro. Desejas realmente servir-me?
— Sim, Senhor! — respondeu a pequena, inflamada de comoção jubilosa, convencida de que o Salvador a conduziria naquele mesmo instante para o Céu.
— Ouve! — tornou o Mestre, docemente.
Ansiosa de pôr-se a caminho do paraíso, a jovem replicou, reverente:
— Dize, Senhor! estou pronta!... Leva-me contigo, sinto-me aflita para comparecer entre os que retêm a glória de servir-te no plano celestial!...
O Cristo sorriu, bondoso, e considerou:
— Não, Adélia. Nosso Pai não te colocou inutilmente na Terra. Temos enorme serviço neste mundo mesmo. Estimo tuas preces e teus pensamentos de amor, mas preciso de alguém que me ajude a retirar o lixo e os detritos que se amontoam, não longe de tua casa. Meninos Cruéis prejudicaram a rede de esgoto, a pequena distância do teu lar. Aí se concentra perigoso foco de moléstias, ameaçando trabalhadores desprevenidos, mães devotadas e crianças incautas. Vai, minha filha! Ajuda-me a salvá-los da morte. Estarei contigo, auxiliando-te nessa meritória tarefa.
A menina preocupada quis fazer perguntas, mas o Mestre afastou-se, de leve...
Acordou sobressaltada.
Era dia.
Vestiu-se à pressa e procurou a zona indicada. Corajosa muniu-se de desinfetantes, armou-se de enxada e vassoura pediu a contribuição materna, e o foco infeccioso foi extinto.
A discípula obediente, todavia, não parou mais.
Diariamente, ao regressar da escola, punha-se a colaborar com a Mamãe, em casa, zelando também quanto lhe era Possível pela higiene das vias públicas e ensinando outras crianças a serem tão Cuidadosas, quanto ela mesma. Tanto trabalhou e se esforçou que, certo dia, o diretor do grupo escolar lhe conferiu o título de Anjo da Limpeza. Professoras e colegas comemoraram festivamente o acontecimento.
Chegada a noite, dormiu contente e sonhou que Jesus vinha encontrá-la, de novo.
Nimbado de luz, abraçou-a, com ternura, e disse-lhe brandamente:
— Abençoada sejas, filha minha! agora, que os próprios homens te reconhecem por benfeitora, agradeço-te os serviços que me prestas diariamente. Anjo da Limpeza na Terra, serás Anjo de Luz no Paraíso.
Em lágrimas de alegria intensa, Adélia despertou, feliz, compreendendo, cada vez mais, que a verdadeira ventura reside em colaborar com o Senhor, nos trabalhos do bem, em toda parte."
("Alvorada Cristã", Neio Lúcio/Francisco Cândido Xavier)
Subscrever:
Mensagens (Atom)